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Horas extras acima da 6ª diária e 36ª semanal em turno ininterrupto de revezamento (o que o trabalhador precisa saber)

Horas extras acima da 6ª diária e 36ª semanal em turno ininterrupto de revezamento
(o que o trabalhador precisa saber)





Por Dr. Romero Agustinho Martins, advogado trabalhista com mais de 10 anos de experiência em defesa dos direitos dos trabalhadores.


Quando o trabalhador faz “virada de turno” — ora de manhã, ora à tarde, ora à noite — é bem comum ouvir: “isso aqui é turno ininterrupto de revezamento, a jornada máxima é 6h”. Mas, na prática, muitas empresas exigem 8, 10 ou até 12 horas por dia, pagando (ou não) horas extras.

A pergunta é: quando essas horas acima da 6ª diária e da 36ª semanal são devidas como horas extras? Vamos por partes.

 

1. O que é turno ininterrupto de revezamento?

Em termos simples, é o sistema em que a empresa funciona praticamente o tempo todo (24h ou algo próximo disso) e os empregados se revezam em diferentes horários, por exemplo:

  • uma semana de manhã,
  • outra à tarde,
  • outra à noite,

ou alternâncias semelhantes, que causem perturbação relevante na rotina e no relógio biológico do trabalhador.

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) explica que esse regime causa desgaste maior à saúde do empregado do que o horário fixo, justamente por causa da troca constante de turnos. Por isso, a Constituição limitou a jornada para quem trabalha em turnos de revezamento a 6 horas diárias.

Importante: a existência de intervalo para refeição ou de folga semanal não descaracteriza o turno ininterrupto. O que importa é a lógica de revezamento em turnos e a continuidade da atividade da empresa.


2. O que diz a Constituição (art. 7º, XIV)?

A Constituição Federal, no artigo 7º, inciso XIV, garante aos trabalhadores:

“jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva”.

Ou seja:

  • regra geral: máximo de 6h por dia e 36h por semana;
  • exceção: é possível ampliar essa jornada por convenção ou acordo coletivo com o sindicato.

Esse dispositivo faz parte do rol de direitos fundamentais dos trabalhadores (art. 7º, caput), que têm como objetivo melhorar a condição social do empregado, protegendo especialmente a saúde e a segurança.


3. Qual o papel da CLT nesse tema?

A CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) define a jornada padrão de 8 horas diárias e 44 semanais (art. 58 c/c art. 7º, XIII da Constituição), além de regular as horas extras (art. 59 e seguintes).

No caso dos turnos ininterruptos de revezamento, a Constituição “puxa” essa jornada para baixo, criando um regime mais protetivo de 6h/36h. Assim, em tese:

  • tudo o que passa da 6ª hora diária, e
  • tudo o que passa da 36ª hora semanal

tende a ser considerado hora extra, salvo se houver negociação coletiva válida autorizando jornada maior.


4. Negociação coletiva e Súmula 423 do TST

A grande virada prática vem da Súmula 423 do TST, que diz, em resumo:

Se a jornada em turno ininterrupto for superior a 6h e limitada a 8h, por regular negociação coletiva, essa jornada é válida, e as horas extras só são devidas acima da 8ª diária.

Ou seja:

  • se não há acordo/convenção coletiva autorizando jornada maior:
    • horas extras acima da 6ª diária e 36ª semanal;
  • se há negociação coletiva válida, ampliando para até 8 horas:
    • 7ª e 8ª horas tendem a ser consideradas normais,
    • horas extras, em regra, apenas acima da 8ª diária (ou do limite semanal fixado).

O próprio TST, em decisões recentes, reafirma que, na ausência de norma coletiva, a jornada de 12h em turno ininterrupto gera direito a horas extras a partir da 6ª hora, utilizando divisor 180 (caso TST-Ag-RRAg-607-75.2018.5.17.0004).


5. O que diz o STF sobre negociação coletiva (Tema 1.046)?

O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou, em repercussão geral, o Tema 1.046, fixando a tese de que são constitucionais os acordos e convenções coletivas que limitam ou afastam direitos trabalhistas, desde que:

  • não envolvam direitos absolutamente indisponíveis, e
  • respeitem as garantias constitucionais mínimas.

Essa decisão fortaleceu a autonomia coletiva, reforçando a possibilidade de negociação da jornada em turnos ininterruptos (inclusive elastecendo para além de 8h em certos casos), desde que a norma coletiva seja legítima e não ultrapasse os limites constitucionais.

Um exemplo é acórdão da SBDI-1 do TST, que, com base no Tema 1.046 do STF, reconheceu a validade de cláusula coletiva que previa jornada superior a 8h em turno ininterrupto, entendendo que essa matéria é negociável no âmbito coletivo (Proc. 0010838-96.2018.5.03.0087, publ. 16/05/2025).


6. STF reafirmando a jornada de 6h

Apesar de reconhecer a força da negociação coletiva, o STF também já reafirmou que o empregado em turnos ininterruptos de revezamento tem direito à jornada de 6 horas, independentemente da forma de concessão de intervalos. Em notícia oficial, a Corte deixa claro que o trabalho em turno de revezamento dá direito à jornada reduzida.

Na prática, isso significa:

  • A regra de 6h/36h continua sendo a base;
  • A negociação coletiva pode alterar essa regra, mas sempre sob escrutínio dos tribunais, especialmente quanto à saúde e segurança do trabalhador.

7. Jurisprudência do TST sobre horas extras acima da 6ª diária e 36ª semanal

Os tribunais trabalhistas têm uma linha bastante consolidada:

  • Reconhecido o turno ininterrupto de revezamento e inexistindo norma coletiva válida, a jornada máxima é de 6h e 36h semanais;
  • Horas que ultrapassam esses limites devem ser pagas como extras, com adicional, reflexos em férias + 1/3, 13º, FGTS etc.

Exemplos (em linguagem simplificada):

  • Em acórdão de 2023, o TST reconheceu a descaracterização da tese patronal e concluiu serem devidas as horas extras excedentes da 6ª diária e 36ª semanal, ao analisar caso de turno de revezamento (voto no processo vinculado ao doc. nº 93367081 – TST).
  • Em outros julgados, a Corte reafirma que, não havendo norma coletiva válida, a realização de jornada superior a 6h em turno de revezamento gera direito às horas extras acima desse limite.

Essas decisões seguem a lógica do art. 7º, XIV, da Constituição e dialogam com a Súmula 423.


8. Como saber se você tem direito a essas horas extras?

Para o trabalhador leigo, alguns pontos práticos ajudam:

  • Você troca de turno com frequência?
    • Um período de manhã, outro à tarde, outro à noite, em ciclos definidos?
    • A empresa funciona de forma praticamente contínua?
  • Sua jornada média diária passa de 6 horas?
    • Se sim, some sua jornada semanal: passa de 36h?
  • Existe acordo ou convenção coletiva da sua categoria prevendo jornada de 7, 8 ou mais horas para o turno de revezamento?
    • Essa norma é específica para turno ininterrupto de revezamento?
    • O sindicato participou da negociação?
  • Você recebe horas extras?
    • São pagas apenas acima da 8ª diária?
    • O adicional é de pelo menos 50% (salvo percentual maior em norma coletiva)?
  • Há registro de ponto confiável?
    • Cartão de ponto, ponto eletrônico, escalas escritas etc.

Se não há norma coletiva ou se ela é abusiva (por exemplo, prevê jornadas muito longas sem contrapartidas adequadas e viola proteção mínima à saúde), aumenta bastante a chance de o Judiciário reconhecer o direito às horas extras excedentes à 6ª diária e 36ª semanal.


9. Quais são os direitos ao reconhecer as horas extras?

Quando a Justiça reconhece que o empregado faz jus às horas extras em razão de turno ininterrupto de revezamento, normalmente são devidos:

  • Pagamento das horas extras acima da 6ª diária e/ou 36ª semanal (ou acima do limite ajustado em norma coletiva válida);
  • Adicional de horas extras (pelo menos 50%, salvo percentual maior em acordo/convenção);
  • Reflexos em:
    • férias + 1/3,
    • 13º salário,
    • aviso-prévio,
    • descanso semanal remunerado (DSR),
    • FGTS + 40% (em caso de despedida sem justa causa);
  • Eventuais diferenças em verbas rescisórias.

São cálculos que normalmente exigem perícia contábil ou atuação de profissional habilitado.


10. Conclusão: fique atento ao seu turno e aos seus direitos

Resumindo:

  • Quem trabalha em turno ininterrupto de revezamento tem, em regra, jornada de 6 horas e limite de 36 horas semanais, conforme o art. 7º, XIV, da Constituição Federal.
  • Horas além desses limites tendem a ser devidas como horas extras, salvo se houver negociação coletiva válida ampliando a jornada (em geral até 8h, à luz da Súmula 423 do TST e do Tema 1.046 do STF).
  • A jurisprudência do TST e do STF oscila dentro desses parâmetros, ora reforçando a proteção da jornada reduzida, ora validando cláusulas coletivas que a ampliam, sempre com atenção à saúde do trabalhador e aos direitos indisponíveis.

Se você desconfia que está trabalhando além da 6ª hora diária ou da 36ª semanal em regime de revezamento, o ideal é:

  1. Guardar documentos (cartões de ponto, contracheques, escalas);
  2. Consultar a convenção ou acordo coletivo da sua categoria;
  3. Procurar orientação jurídica especializada para avaliar, à luz da legislação e da jurisprudência atual, se há direito a cobrar essas horas extras e seus reflexos.

Links úteis (fontes oficiais e técnicas)

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